Acreditamos que o movimento das empresas em direção à inovação, sustentabilidade e práticas ESG não ocorre de uma hora para outra, mas de fato é um processo de transição e uma direção de caminho a ser trilhado.
Apesar de começar a agir ser importante, inclusive para gerar aprendizado e começar a tangibilizar intenções, no tempo, apenas realizar iniciativas e práticas isoladas não é suficiente para garantir a consistência que esse movimento precisa. É necessária uma mudança da cultura empresarial, incorporando a inovação e sustentabilidade na estratégia e na tomada de decisão de forma transversal a toda empresa.
A mudança cultural e engajamento de colaboradores, para qualquer temática, é por si só um grande desafio, mas sem este fator acreditamos que a transição e preparação das empresas para um futuro sustentável não irá acontecer e se consolidar.
Esse é um trabalho que deve ser feito de forma coletiva, envolvendo o RH, comunicação interna, lideranças, diretoria e as próprias áreas de inovação e sustentabilidade. Neste texto vamos mostrar alguns dos caminhos para implementar uma cultura de inovação e sustentabilidade e premissas que devem ser consideradas.
Concordamos muito com a afirmação feita pelo Ricardo Young, em entrevista para o Quintessa: “O ESG está sendo visto como uma coisa nova, mas o que tem realmente de novo é a necessidade de uma mudança radical da cultura empresarial na direção de uma visão sistêmica do seu impacto no meio ambiente, na sociedade e na economia”.
Por que a mudança cultural é importante?
Incorporar a inovação e o olhar para a sustentabilidade vai além de assumir compromissos ou criar iniciativas e práticas para mitigar riscos e impactos socioambientais negativos. Envolve os valores da empresa, a forma de trabalhar, de se relacionar e de se conectar com o propósito da organização.
Além disso, é preciso introduzir o tema de forma a capacitar e desenvolver os colaboradores tanto na importância dele, quanto em aspectos mais ‘técnicos’ que envolvem o seu trabalho no dia a dia.
Por exemplo, em uma empresa que caminha em direção à adoção de práticas ESG, a área de compras deve estar instrumentada para entender quais são as externalidades dos fornecedores que contrata, tomando decisões baseadas no impacto socioambiental gerado e não somente em preço.
A cultura e os valores devem orientar o que essa área faz, independente da proposta comercial do fornecedor. Um exemplo disso é o caso do Carrefour, que reflete a contratação de uma empresa de segurança terceirizada não alinhada aos valores da empresa, e que causou uma consequência grave para a sua reputação. Não basta a empresa trabalhar o ESG no escritório, se o tema não se reflete também na operação, no ponto de contato com o cliente.
A mesma coisa acontece com a área de RH, que além de ser a ‘guardiã’ da cultura organizacional, deve orientar suas práticas de seleção e desenvolvimento dos colaboradores baseadas em aspectos de diversidade. Não basta assumir compromissos se não apoiar e capacitar os responsáveis por eles no dia-a-dia.
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Ter clareza dos valores e propósito da empresa
Dado que este movimento deve ir além do “o quê” a empresa faz, mas incluir também o “por que” e “como” ela faz, ele precisa estar alinhado ao seu propósito e valores. Vale refletir: Para que existimos? No que acreditamos? O que é realmente importante para nós? Qual a nossa forma de agir?
Isso ajuda com que a empresa não apenas adote ações que estão “em alta” ou são uma tendência no mercado, mas de fato reflita sobre como deseja agir nesta direção. Essa reflexão traz uma base sólida para que as ações sejam sustentadas ao longo do tempo.
Por exemplo, para algumas empresas, o valor da diversidade pode ter maior importância, para outras pode ser a colaboração e confiança, e para outras é pode ser o impacto no meio ambiente. É claro que a empresa pode trabalhar todos esses aspectos, mas é importante analisar e colocar na balança esses elementos, pois serão critérios para a tomada de decisão e que irão garantir que toda a empresa caminhe na mesma direção.
Além dessas reflexões mais amplas, é preciso combiná-las com o modelo de negócio da empresa. A depender da sua atuação, o compromisso com a neutralização da emissão de carbono pode ser mais ou menos relevante do que um compromisso com remuneração justa ao longo de toda sua cadeia de valor, por exemplo – incorporando análises como a matriz de materialidade da empresa nesta decisão.
Não só ter essa clareza, isso deve estar introjetado na cultura em forma de rituais e símbolos compartilhados e vivenciados por todos os colaboradores, para que seja um pacto coletivo, colocando todos no mesmo barco.
O envolvimento das lideranças é fundamental, mas não pode parar em um movimento top-down imposto apenas com base na hierarquia
Para que aconteça um comprometimento real com a inovação e sustentabilidade, é fundamental que os(as) executivos(as), a presidência e até o conselho estejam envolvidos e engajados. É importante que deem o exemplo e as diretrizes, mas não é suficiente. Se toda a organização não estiver vivenciando e acreditando nos mesmos valores, é difícil que se concretize.
Além disso, é muito mais fácil que as pessoas se engajem quando participam do processo de construção deste movimento e não quando é imposto de cima para baixo.
Um exemplo são grupos de trabalho, grupos de afinidade, coletivos, GTs ou comitês de temas como diversidade, maternidade ou até sustentabilidade (quando não faz sentido uma área formal na empresa). Incentivar que colaboradores de grupos historicamente sub-representados ou aliados e engajados na causa se organizem e proponham práticas para a empresa tem muito valor e traz legitimidade e assertividade nas ações. Neste caso é importante que haja um orçamento, comprometimento e envolvimento de áreas responsáveis para de fato colocar em prática as demandas trazidas pelo grupo.
Em entrevista para o Quintessa, o Luis Guggenberger trouxe um exemplo de como os temas são trabalhados na Vedacit: “elencamos na nossa Matriz de Materialidade os 7 temas principais que vamos trabalhar até 2025, e para cada um desses temas sorteamos padrinhos (executivos que respondem diretamente ao CEO) que vão se reunir com os líderes de projetos e discutir os KPIs, orçamento e ações naquele tema. Isso força também o(a) alto(a) executivo(a) a estudar sobre o tema e ter uma visão 360º. Por exemplo, nosso CFO é padrinho do tema de Diversidade, então ele sai da caixinha da área das finanças e desafia a área de Gente e Gestão sobre como vamos trabalhar esse tema integralmente na companhia.”
Capacitações e treinamentos
Em um movimento de mudança cultural, é importante colocar todas as pessoas na mesma página. Alguns conhecimentos são básicos e devem ser compartilhados antes da implementação prática de algumas ações.
Conhecimentos sobre diversidade e inclusão, por exemplo, ajudam a preparar um ambiente muito mais acolhedor para trazer pessoas diversas para o time. Não basta só contratar, é preciso incluir e fazer com que se sintam parte. As pessoas têm diferentes níveis de conhecimento sobre o assunto, e todos nós temos vieses inconscientes – explícitos em maior ou menor grau, a depender do nosso contexto e vivências. Muitas podem não saber que um termo que utilizam na sua fala pode ser ofensivo para outros, para dar um exemplo básico.
Conversando com gestores de empresas, vemos que a formação até hoje foi majoritariamente voltada para gerir a operação, otimizar e alcançar cada vez mais resultados. O que falta para a grande maioria das pessoas é entender contextos mais complexos como a mudança do clima, a desigualdade social , a gestão de resíduos e todas as externalidades do processo produtivo. E é neste ponto que a capacitação mais técnica é essencial para diferenciar aquelas empresas que assumem compromissos superficiais, daquelas que realmente entenderam a gravidade dos problemas e irão se comprometer com um plano de implementar práticas mais sustentáveis.
Para os colaboradores que não necessitam de saberes mais complexos na área, introduzir o assunto de forma geral, falando sobre ODS, economia circular e até pequenas ações do dia a dia para fazer em casa, são portas de entrada para expandir o interesse no tema e engajar nessa mudança cultural, além de conhecimentos importantes para todos nós como cidadãos mais conscientes.
Treinamentos de metodologias e ferramentas de inovação, como empreendedorismo, design thinking e métodos ágeis também ampliam a visão sobre a resolução de problemas e formas de trabalhar. Mas além do conteúdo, é preciso também pensar na forma de levar esse conhecimento. Muitas vezes cursos e workshops não são suficientes, o que nos leva ao próximo tópico.
Acelerando a mudança por meio da prática
No Quintessa trabalhamos com programas de inovação aberta nas empresas, trazendo soluções inovadoras de startups para os desafios de sustentabilidade, novos negócios e responsabilidade social. Um dilema típico que vemos ao implementar estas iniciativas é se primeiro a empresa deveria criar essa cultura de inovação e sustentabilidade e capacitar as lideranças.
O processo de mudança cultural é sempre vivo e está em constante evolução, então, o que vemos é que os programas de inovação aberta fazem parte desse processo e ajudam a tangibilizar e acelerar muitas transformações culturais.
Programas de aceleração, por exemplo, oferecem um espaço de mentoria em que lideranças e colaboradores podem se envolver com empreendedores e aprender na prática como é trabalhar de forma ágil e inovadora no relacionamento com as startups, além de atuar na prática com soluções que geram impacto positivo.
A prática estimula o desenvolvimento de competências como a criatividade, agilidade, colaboração, iniciativa e abertura ao novo, pensamento sistêmico, competências essenciais para encontrar soluções aos desafios de sustentabilidade e para se adaptar a mudanças.
No Braskem Labs, que realizamos em parceria com a Braskem, são abertas inscrições para os colaboradores participarem como mentores do programa, e a cada ano as vagas ficam mais disputadas. O pitch day, etapa final da seleção das startups para o programa, é aberto para os colaboradores assistirem, votarem e fazerem perguntas aos empreendedores, e na última edição engajou mais de 200 pessoas.
Programas em que implementamos pilotos de soluções das startups oferecem a experimentação prática e a geração de resultados no curto prazo. Além disso, contratar soluções de startups explicita um outro fator: não basta ter uma cultura de inovação e sustentabilidade se o processo de suprimentos ainda é burocrático e dificulta a adoção rápida de iniciativas inovadoras – a mudança cultural realmente deve estar em todas as áreas e processos. Trazer programas práticos, que provoquem e acelerem as mudanças pode ajudar muito neste processo, além de trazer uma organização parceria especialista para orientar a como realizá-las.
Em um programa que realizamos com o Banco BV, facilitamos a cocriação entre colaboradores do banco, para que desenvolvessem novos produtos, serviços e práticas empresariais, contando com o suporte de empreendedores como especialistas – e estimulando a inovação e intraempreendedorismo entre o time. Neste programa, além do desenvolvimento de competências dos colaboradores, colocamos em prática a criação de novos produtos, serviços e práticas empresariais que gerassem valor para o negócio e impacto positivo de forma integrada.
A inovação aberta como aliada
As startups têm potencial de gerar valor e resolver desafios de quase todas as áreas, por isso a inovação aberta também tem papel transversal na empresa e deve ser trabalhada na cultura. Para que o trabalho seja possível, as pessoas precisam acreditar que não têm todas as respostas internamente, estarem abertas a dialogar, a aprender, a ouvir.
É interessante garantir que um grupo de pessoas ou uma área seja responsável por fazer com que as iniciativas de inovação aberta aconteçam, estruturando o processo e um pipeline de startups para que outras áreas possam “beber dessa fonte”.
A área de RH, por exemplo, pode se beneficiar da inovação aberta ao conhecer startups de impacto que trabalham a diversidade em diferentes frentes. Temos na nossa rede startups focadas em contratação de profissionais diversos; capacitação profissional de refugiados, jovens, pessoas LGBTQIA+, egressos do sistema prisional; implementação de práticas e sensibilização sobre temas como maternidade, parentalidade, masculinidade e empoderamento de mulheres no âmbito profissional; soluções inovadoras para treinamento e engajamento de colaboradores, entre outras.
Pensar uma cultura de inovação e sustentabilidade é isso: buscar formas mais inovadoras de gerar impacto social e ambiental nas suas atividades – seja nas práticas de gestão, como também criando novos produtos, serviços e modelos de negócio.
“Para o meu time, o Braskem Labs é uma oportunidade de interagir com um ecossistema que não teríamos outra oportunidade. Na área de desenvolvimento de mercado buscamos novos usos e aplicações para os nossos plásticos, e a provocação que acabo levando para a equipe é: além do modelo tradicional que a gente já vinha mapeando pra encontrar essas inovações, o que a gente pode trazer através das startups? E naturalmente isso acaba cativando as equipes para buscarem as novidades. É uma semente que vai reverberando.” – Renato Yoshino | Diretor dos negócios de Agro, Infra e Indústria na Braskem, durante gravação de um webinar com o Quintessa.
Mostrar resultados gera engajamento e incentivo
Quando os colaboradores enxergam o resultado das ações de inovação e sustentabilidade, o engajamento também aumenta. Não só daqueles envolvidos diretamente nas ações, mas em todos os que têm o desejo de se sentir parte de ‘algo maior’, de saber que a sua empresa está contribuindo para a geração de impacto positivo na sociedade.
Sabemos que o processo de inovação demanda abertura para experimentação e para lidar com riscos, mas começar pequeno e ir demonstrando resultados tangíveis faz parte dessa transformação cultural. Cuide do engajamento das pessoas chave e ajude-os a entender que é um processo experimental e que as respostas serão dadas ao longo do caminho.
Como falamos neste texto, não é tão óbvio para muitas pessoas que uma ação de impacto positivo pode gerar novas formas de relacionamento com o cliente e fidelização. Conforme a cultura vai amadurecendo e os resultados vão sendo demonstrados, esse tipo de iniciativa vai se tornando cada vez mais natural para os desafios das áreas.
No programa CPFL na Comunidade, implementamos pilotos de negócios de impacto em comunidades de baixa renda atendidas pela CPFL Energia. As soluções de educação financeira, capacitação de mulheres em elétrica básica e reciclagem de uniformes geraram melhoria da percepção de marca pela população e resultados mensuráveis na redução do consumo de energia dos clientes. Ou seja, novas formas de se pensar o relacionamento com esse público e de gerar impacto além das ações de responsabilidade social.
Pensando em mostrar o valor desse tipo de iniciativa para toda a companhia e gerar engajamento, a equipe responsável pelo projeto circulou algumas newsletters internas durante a implementação, contando sobre os desafios, os resultados e os depoimentos dos beneficiários na ponta.
Ter metas atreladas à inovação e sustentabilidade traz um incentivo a mais para acelerar essa mudança cultural. Indo mais além, muitas empresas já começaram a atrelar o bônus de executivos(as) ao cumprimento das metas ESG – o que tangibiliza o compromisso e incentiva a mudança.
Por fim, as empresas são feitas de pessoas, e cada uma tem suas crenças e motivações individuais para se engajar em determinados assuntos. Por isso, ao mesmo tempo em que se define e publica uma estratégia para ESG, sustentabilidade ou inovação, é preciso pensar nos fatores da cultura empresarial que sustentam e engajam as pessoas para essa agenda. Não é um desafio fácil, mas vale a pena dedicar energia aqui.
A sustentabilidade não é responsabilidade de uma área, e sim de todas as pessoas. A inovação como alavanca da sustentabilidade – e vice-versa – deve estar no checklist de todos os projetos e decisões do dia a dia. A cultura é um processo contínuo e de longo prazo, tendo o propósito e valores como base.
Como falamos neste texto, as empresas estão em diferentes estágios de maturidade em direção a um futuro mais sustentável, e o nosso papel no Quintessa é acolhê-las e direcioná-las nesta transição. Entre em contato conosco para conhecer nossa atuação.