A gestão de incentivos em um negócio é composta por diversos elementos, sendo a remuneração um deles. Este vídeo do Dan Pink sobre o que de fato motiva as pessoas ilustra a diversidade de elementos a qual nos referimos, financeiros e não-financeiros.
A remuneração fixa é um destes elementos, somando-se a ela outros benefícios, como VT, VR, VA e seguro de saúde. Um modelo de remuneração variável também pode compor esses incentivos.
Outros elementos são a oportunidade de desenvolvimento pessoal e profissional por meio de cursos e treinamentos, o ganho de autonomia e de poder de decisão, participação e co-construção. O ambiente de trabalho, a flexibilidade de horário, a perspectiva de crescimento e a clareza sobre o impacto do trabalho realizado também são considerados.
Esses elementos são complementares e podem ir evoluindo ao longo do amadurecimento da empresa, com um maior fôlego financeiro, clareza na governança, capacidade de gestão de pessoas, entre outros. Nesse texto buscamos orientar os empreendedores na elaboração de um modelo de remuneração variável, a partir de experiências do Quintessa na gestão desse incentivo.
Comece com a visão macro
A remuneração fixa corresponde à função que a pessoa exerce (suas responsabilidades e atribuições). Assim, deve ser condizente com ela, considerando, por exemplo, o respeito aos valores da empresa, a senioridade para lidar com autonomia e responsabilidade e a qualidade das entregas. É o que chamamos de “salário”.
Uma frase muito dita é que “o salário deve ser alto o suficiente para que o colaborador não se preocupe com a sua segurança e para que esta não seja uma preocupação dele, mas ‘baixo’ o suficiente para não gerar um conforto demasiado no sentido de gerar desconexão e desincentivo a trabalhar por resultados relevantes para a empresa”.
Nessa linha, caso você já tenha uma equipe, é importante conhecer seu time e o que de fato importa para as pessoas. Pode não adiantar nada pagar uma elevada remuneração fixa, se na verdade as pessoas se importam e são motivadas por oportunidades de desenvolvimento pessoal, ou o contrário.
Vale também olhar para o mercado, no sentido de quem está “concorrendo” pelos seus talentos. Ou seja, quais propostas as pessoas do seu time podem estar recebendo? O quanto o que você oferece, no sentido mais completo da experiência para o colaborador, é suficiente para que elas desejem ficar?
É comum que, em mercados muito aquecidos, haja uma pressão por salários mais altos, por exemplo. Não necessariamente você precisa “seguir a maré”, mas você precisa estar consciente disso e preparado(a) para responder a esta pressão com outras formas de incentivo.
Há muitos que consideram a participação acionária como uma forma de remuneração, principalmente nos estágios iniciais do negócio, pela falta de fôlego financeiro (detalhamos neste texto sobre a prática de vesting). O cuidado aqui é para que não crie uma sociedade desalinhada e enfraquecida, por não serem pessoas nas quais você de fato confia, que conseguem tomar o risco pelas decisões e pela empresa, pensar de forma coletiva e que realmente têm competências para fazer a empresa dar certo, mas apenas aquelas que você não teve como pagar um salário justo no início da trajetória.
Essa visão macro é essencial para que você tenha uma visão sistêmica sobre quais são os diversos elementos que você está oferecendo, ou pode oferecer, para atrair e reter seus talentos. Dizendo de outra forma, para garantir que seu time se sinta cuidado pela empresa e, ao mesmo tempo, estimulado para atingir as metas que indicam a evolução da empresa.
Ainda neste momento inicial, lembre-se do que é importante para ser consistente com os valores e cultura da empresa, o que nos leva ao próximo aspecto.
Reflita sobre os comportamentos que deseja incentivar
As regras do jogo moldam o comportamento das pessoas do seu time e é preciso estar atento(a) a quais comportamentos você deseja incentivar. Quando falamos de modelos de remuneração variável, antes de determinar as regras em si, você precisa pensar sobre o tipo de cultura que deseja para o seu negócio.
- Você deseja remunerar as pessoas por superarem suas metas individuais e/ou pela empresa (todo o time) superar suas metas globais?
- Você deseja remunerar as pessoas individualmente e/ou remunerar as pessoas de uma área enquanto coletivo?
- Você deseja remunerar as pessoas pelas ações que realizaram e/ou pelo resultado das ações que realizaram?
- Você deseja considerar na remuneração o que a pessoa entregou e/ou também a forma com a qual ela realizou a entrega?
Sem clareza sobre isso, um modelo de remuneração variável, ao invés de ajudar com que o time se motive a ir em uma direção saudável, pode fazer com que a empresa tenha péssimos resultados e seu time fique muito desagregado.
Um exemplo para tangibilizar: se você remunera seu time comercial apenas com base em uma comissão sobre o valor dos contratos fechados e paga esta comissão no ato do fechamento, em um contexto em que há total autonomia dos vendedores para a negociação de contratos, você pode chegar em um cenário em que o time atingiu as metas de vendas, mas… Você teve que pegar um empréstimo no banco para pagar a comissão, pois os vendedores deram um prazo de pagamento longo e com carência ao cliente, para estimular que fechasse o contrato, e você não tinha saldo suficiente em conta para pagar a comissão.
Ou, você já pagou a comissão com base no valor total do contrato, mas na verdade os vendedores explicaram muito mal a proposta de valor, o cliente se decepcionou e cancelou o contrato no meio do serviço, fazendo com que você tenha pago um valor de comissão maior do que o que de fato entrou de receita na empresa.
Outro exemplo é ter um cenário em que você remunera excessivamente baseado(a) apenas no comportamento individual e acaba tendo uma cultura muito competitiva, sem ações coletivas ou colaborativas dentro do time. Ou no oposto, em que a regra considera excessivamente o ganho coletivo e as pessoas que mais entregam se desmotivam e se sentem injustiçadas por sentirem que estão carregando o time nas costas.
Não existe um único modelo certo ou errado, mas é necessário lucidez para pensar um modelo que seja alinhado ao que você acredita, aos valores e cultura da empresa.
O que considerar em um modelo de bônus
Uma das formas de remuneração variável é o pagamento de bônus. Diferente ao que descrevemos sobre a remuneração fixa, ele tem a ver com a busca pela excelência, com a atitude da pessoa e o valor da sua entrega.
Cada empresa, de acordo com seu setor, modelo de negócio, estágio de negócio, entre outras variáveis, deve pensar nos elementos que mais fazem sentido para considerar ao determinar o bônus de uma pessoa.
Listamos aqui alguns dos quais gostamos bastante:
- O quanto a pessoa superou seu resultado dentro das metas individuais?
- O quanto este resultado individual foi relevante para o coletivo e contribuiu para o resultado final da empresa?
- O quanto atingiu o resultado por esforço/dedicação própria ou foi favorecido(a) por fatores externos?
- O quanto atingiu o resultado abrindo uma perspectiva nova/de futuro para a empresa?
- O quanto atingiu o resultado agregando/desenvolvendo ou excluindo pessoas?
- O quanto está alinhado(a) e é um(a) representante dos valores e cultura da empresa?
- O quanto “vestiu a camisa” e agiu pelo bem da empresa (por exemplo, abrindo portas que poderiam ajudar os colegas de outra área)?
- O quanto topou e foi parceiro(a) para lidar com os desafios que se apresentaram ao longo do caminho?
Além disso, o modelo tem outros pontos importantes: como você forma o bônus pool (total que será pago ao time) e como você distribui ele dentro do time.
Um modelo que gostamos bastante é de formação do bônus pool a partir de uma porcentagem do lucro líquido da empresa, de forma a se aproximar da ideia de ser uma forma de repartir entre o time o resultado que foi gerado coletivamente.
Gostamos também quando existe um gatilho que libera o bônus pool. Trata-se de uma condição que precisa ser atingida para que haja bônus. É uma prática legal para garantir que todos na empresa olhem para os mesmos resultados e pensem de forma coletiva. Por outro lado, se a empresa não atingiu sua meta global, uma pessoa que tenha ido muito bem nas suas metas individuais também ficará sem receber bônus.
Pode haver apenas um gatilho (por exemplo: “Gerar 1 milhão de lucro” ou “Beneficiar 1 milhão de alunos”), ou podem haver diversos gatilhos que compõe o todo (por exemplo: “gerar um milhão de lucro” libera 40% do valor total e “beneficiar 1 milhão de alunos” libera os outros 60% do total).
Um outro elemento importante é considerar a posição de caixa da empresa, principalmente em modelos em que há descasamento entre competência e caixa – pois a empresa pode ter gerado lucro, mas não ter dinheiro suficiente no banco para pagar o bônus pool.
A partir da formação do bônus pool, 100% do seu valor é distribuído entre as pessoas do time, com cada pessoa se apropriando de uma porcentagem a partir das respostas às perguntas listadas acima.
Uma variação deste modelo é distribuir primeiro entre áreas, por exemplo, 50% para o time de vendas e 50% para o time de produto e então alocar o valor entre as pessoas do time. No entanto, vale a ponderação sobre a quantidade de pessoas em cada time (é muito diferente distribuir 50% em 5 pessoas ou em 50 pessoas) e se há de fato uma agregação de valor pré-estabelecida de cada área.
Outras formas de remuneração variável
A forma que descrevemos acima não é a única possível.
Algumas pessoas preferem o modelo de multiplicador da remuneração fixa. Ou seja, os colaboradores recebem 1-2-3-(…)-10 vezes o valor do seu salário. É um modelo mais simples, mas que leva a um cenário no qual aqueles que já recebem os maiores salários, provavelmente receberão os maiores bônus. Uma pessoa júnior que gerou um alto valor para a empresa pode acabar recebendo menos do que uma pessoa sênior (com salário mais alto) que não gerou valor. Ainda assim, é bastante usado no mercado.
Nesta linha, há modelos que multiplicam o percentual que a pessoa atingiu da meta individual (ex: realizou 80% da meta de R$ 500 mil em novos contratos vendidos) pelo percentual da meta coletiva da empresa (ex: realizou 90% da meta de R$ 2 milhões de lucro líquido). Este novo “fator” é então multiplicado pelo salário da pessoa, determinando o valor que receberá de bônus.
É possível criar diversas variações como essa, fazendo com que as metas tenham diferentes pesos para compor este “fator” multiplicador do salário. É possível que este “fator” seja aplicado sobre um valor máximo de bônus individual potencial, não necessariamente o salário da pessoa.
Além disso, pode-se pensar em modelos que não variam de 0% a 100%, mas de 70% a 100%, ou seja, se a pessoa atinge menos do que 70% da sua meta individual, ela não é elegível a receber bônus.
Um outro modelo clássico é o da comissão, como falamos ao início da comissão de vendas. É um modelo muito praticado no mercado, mas, como mencionamos, pode incentivar comportamentos mais individualistas e de curto prazo, sem conectar o time ao resultado da empresa como um todo. Ainda assim, pela sua simplicidade, é muito fácil de aplicar na prática.
Outro modelo ainda é o PLR (Programa de Participação nos Lucros e Resultados). É um modelo com regras determinadas na nossa legislação trabalhista, sendo menos flexível que o modelo de bônus, e permite aos colaboradores receberem parte do resultado gerado.
Dicas finais ao implementar um modelo de remuneração variável
Tenha clareza sobre o ritual que será implementado: Quem determinará a remuneração? Será a liderança/chefia da pessoa ou um comitê? Qual será a frequência? Anual? Trimestral?
Deixe as regras do jogo claras – e cumpra elas com transparência. O time precisa confiar no modelo e a confiança vem também com o tempo e o cumprimento dos acordos. Se o modelo levar em consideração o atingimento de metas, estas precisam estar claras desde o início.
Mas cuidado com a transparência “exagerada”: ser transparente não significa necessariamente abrir para todo o time o quanto cada um recebeu de bônus individualmente. A depender da maturidade e senioridade do time, pode funcionar muito mal, além de ser desrespeitoso e expor aqueles que não tiveram um bom resultado naquele ano.
Pondere sobre o que será pré determinado ou não – e caso não seja, por qual regra será feita a decisão depois. Por exemplo, no modelo de alocação de porcentagem/ participação no bônus pool que descrevemos, há menor previsibilidade do que no modelo de comissão. Deixe claro quem determinará essa alocação e com base em quais critérios ela será feita.
Lembre-se que se trata de cuidar do seu time. A avaliação por trás da remuneração variável não deveria ser uma surpresa para a pessoa ao final do ano. Busque fazer trocas de feedback frequentes, não apenas ajudando a pessoa a se desenvolver, mas também trazendo lucidez sobre os aspectos que não estão colaborando para uma boa avaliação.
Gestão de pessoas e estrutura de remuneração e incentivos são pautas que trabalhamos no programa de Tração. Acesse mais textos sobre Gestão de Pessoas aqui no blog.
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