Grandes e médias empresas estão cada vez mais buscando se conectar à agenda de impacto positivo. Seja mitigando o impacto negativo gerado, gerando impacto positivo a partir de sua operação e iniciativas, seja integrando à sua atividade principal a partir de um novo portfólio de produtos e serviços. Dentro dos caminhos possíveis, estão os instrumentos financeiros, como títulos de dívida atrelados a metas sociais e ambientais.
Esses títulos podem ajudar as empresas a avançarem nas temáticas ambientais, sociais e de governança, atraindo recursos para viabilizar a implementação de ações para que atinjam suas metas.
São muitas as modalidades de títulos, a exemplo dos green bonds, social bonds, sustainable bonds e dos sustainability-linked bonds. Falarei neste texto sobre este último.
Segundo relatório da Moody´s, o mercado de Sustainability Linked Bonds (SLBs) saiu de US$ 9 bi em 2020 para US$ 90 bi no ano passado. Neste ano, o montante pode chegar a US$ 200 bilhões. Os números mostram que ele está crescendo com velocidade.
Na gravação de um dos episódios do Ponto de Ebulição, podcast do Quintessa, conversei com a Luiza de Vasconcelos, head de Negócios ESG no Itaú BBA, e com Marcio Lino, na época, diretor de ESG da Tim, que juntos emitiram uma das maiores operações brasileiras de títulos do tipo Sustainability Linked Bonds (SLBs). Compartilho aqui alguns dos aprendizados e dicas sobre o tema.
Os SLBs têm como característica, além do foco no atingimento de metas ESG, a flexibilidade na utilização dos recursos e taxa de juros relativa ao atingimento das metas.
Por meio desses recursos é possível vincular as empresas a um incentivo positivo ou uma lógica de punição. No primeiro caso, quanto melhor o desempenho da organização em relação à meta, menor a taxa de juros que ela paga. No segundo, quanto pior o desempenho, mais caro ela pagará na taxa de juros. Porém, não necessariamente uma empresa pagará uma taxa de juros menor via SLBs do que pagaria via outros títulos financeiros, pois o valor da taxa varia de acordo com outros fatores macroeconômicos e de característica de risco da empresa. Ou seja, a motivação em emitir um SLB não deve ser meramente baseada em um benefício financeiro. Outros potenciais benefícios podem ser enxergados. O reforço ao posicionamento da empresa, da sua narrativa e do explícito comprometimento com as metas são alguns exemplos.
A emissão de um SLB começa com um bom embasamento estratégico e uma etapa consistente de planejamento e formulação de metas. Elas devem ser materiais, relevantes e ambiciosas, representando uma melhora significativa dos indicadores-chave de desempenho. Não pode ser algo que seria facilmente atingido com o que a empresa já faz atualmente.
A TIM, por exemplo, trabalhou durante cerca de quatro anos até a emissão da dívida, em uma jornada que contemplou a publicação de metas públicas de sustentabilidade e o acompanhamento por meio de relatórios globais, como GRI.
Além disso, será necessária a determinação das características da emissão (como o tempo de cumprimento das metas) e a contínua elaboração de relatórios para acompanhamento da performance e cumprimento das metas.
Outro elemento importante é a governança. Os tomadores de decisão – como conselho, presidente, CFOs e outras instâncias – devem estar alinhados e engajados com as metas. Ter todos engajados é essencial para que não se emita o título contando apenas com uma área interessada mobilizada. Existe um risco financeiro atrelado ao seu não atingimento e estas costumam ser desafiadoras, no sentido de demandar soluções sistêmicas, com atuação de diversas áreas de forma integrada.
Como quase toda tendência, há de se cuidar das boas práticas para não acabar com a potencial oportunidade antes mesmo que ela tenha se concretizado. Assim, o desejo é que o mercado avance na agenda com responsabilidade, prezando pela consistência de sua estratégia ESG e vendo o instrumento financeiro como um aliado da sua jornada por uma transformação real.
Este texto foi publicado originalmente na coluna da Co-CEO do Quintessa, Anna de Souza Aranha, na Folha de São Paulo.